Pacientes serão indenizadas por cárcere privado e maus-tratos em casa de acolhimento no Crato
Um
processo julgado pela 1ª Vara Cível da Comarca do Crato resultou na condenação
do responsável por um espaço terapêutico voltado ao público feminino. Fábio
Luna dos Santos, proprietário da unidade denominada Casa de Acolhimento Água
Viva, foi sentenciado a reparar moralmente um grupo de mulheres submetidas a
confinamento e maus-tratos. O total das compensações fixadas pela Justiça soma
R$ 390 mil.
O caso
veio à tona após a fuga de uma das internas, que conseguiu alertar a família
por meio de um bilhete, desencadeando uma apuração por parte das autoridades. A
denúncia revelou que 34 mulheres estavam privadas de liberdade, em ambientes
sem condições mínimas de convivência ou assistência adequada.
Durante a
investigação, foram encontrados indícios de que a instituição mascarava sua
real operação. Embora divulgasse a prestação de apoio psicológico e recuperação
para dependentes químicas ou pessoas com distúrbios psiquiátricos, o local
funcionava de maneira clandestina, impedindo até mesmo o acesso dos familiares
às alas internas.
As
pacientes, segundo o processo, passavam os dias isoladas, trancadas em
compartimentos semelhantes a celas. Elas só deixavam esses espaços para
realizar tarefas compulsórias, como limpeza pesada, serviços manuais e manuseio
de resíduos. Em vários casos, eram forçadas a limpar os próprios dejetos. As
condições variavam conforme critérios subjetivos, como o poder aquisitivo e a
proximidade familiar, sendo mais severas para quem tinha menos meios de denúncia.
A
Defensoria Pública do Estado do Ceará ajuizou ação civil pública requerendo
reparação por danos morais individuais e coletivos. Na defesa, o réu negou as
acusações, alegando que o bilhete usado como prova teria sido forjado. Ele
também argumentou que houve restrições temporárias de visita apenas durante a
pandemia de Covid-19, seguindo orientações sanitárias. Segundo ele, a rotina
das internas era terapêutica e acompanhada por profissionais.
A
sentença proferida em 8 de abril de 2025 destacou que a existência de espaços
com grades e travamentos externos constituía privação ilegal de liberdade. O
magistrado José Batista de Andrade considerou as evidências como suficientes
para caracterizar cárcere privado e violação da dignidade das pacientes.
Em sua decisão,
o juiz destacou que as mulheres acolhidas foram submetidas a um cenário de
opressão física e psicológica, marcado por ausência de higiene, alimentação
controlada, trabalho forçado e humilhações constantes. “Tais práticas ferem os
princípios mais básicos da convivência humana e representam afronta direta à
proteção de pessoas em situação de vulnerabilidade”, registrou.
A
sentença impôs o pagamento de R$ 50 mil por danos morais coletivos e R$ 10 mil
para cada uma das 34 vítimas, além da proibição, por cinco anos, do exercício
de qualquer função relacionada ao acolhimento, assistência ou tratamento de
pessoas com transtornos mentais.